sexta-feira, 30 de maio de 2014

Como é bom, enquanto comemos ovinhos de amendoim compulsivamente e mantemos os nossos pés colados. Como é bom quando você sugere, ostentando um sorriso de criança em véspera de Natal e arregalando bem os olhos, que troquemos a rotineira e sem graça salada por uma gordurosa Pizza Hut com borda exageradamente recheada. Acho até que gosto mais de você do que de massa pan. E que amo, sem peso na consciência, os dias nos quais resolve me livrar das garras entediantes do regime. As fibras, as gorduras boas, os fitoesteróis e todas aquelas coisas que comemos somente porque os médicos recomendaram, com certeza, podem nos esperar. Afinal, um nhoque com você faz de um dia comum, qualquer um, um delicioso Carnaval.
Como é bom quando finalmente chegamos ao hotel, abrimos a porta de um quarto que geralmente cheira a tabaco de antigos hospedes e, sem ceder àquela dor advinda das frustrações, apenas rimos após descobrir que fomos, pela milésima vez, enganados pelas fotos picaretas de algum site viagens. Ao invés de chorar ou de perder tempo reclamando com o gerente, sobre a cama que na foto parecia infinitamente maior, aplicamos algumas cambalhotas de alegria e, sem sofrimento por fazer com que o primeiro passo do roteiro nos espere mais um pouco, vestimos a nossa melhor fantasia: a nudez franca. E no banheiro do hotel, local de onde a banheira – aquela que nas fotos mais parecia uma piscina de ondas – evaporou, antes mesmo de começarmos a exploração do novo território geográfico, você geralmente ri do meu moicano de xampu – o mesmo que eu faço no banheiro da sua casa. E, em meio ao vapor que embaça o espelho, para nos tornamos mais audíveis do que o som da ducha, conversamos quase aos gritos. E você, sempre sem reclamar, permanece comigo por lá – sentada sobre a tampa da privada – até que eu termine de ensaboar o meu corpo e diga: “Sua vez, cabeça de toy art!”. Às vezes, também chamo você de “cabeça de cogumelo”. Ou de “cabeça de rambutão”. Ou de “cabeça de purê de batata” Ou de cabeça de alguma coisa engraçada que eu escolho, aleatoriamente, apenas para fazer você rir.
É tão bom quando você, somente após a segunda garrafa de vinho e com os dentes já totalmente roxos, confessa que gosta de mim, de verdade. E quando fala rindo, com voz meio mole, que meus olhos estão quase fechados. É tão bom quando, ao seu lado, acordo de um sonho bom e, ao notar a sua presença imóvel, ao invés de tentar voltar ao momento lúdico do qual saí, prefiro ficar de olho na cara de paz que faz enquanto dorme. Você, dorminhoca do jeito que é, nem nota, mas se eu ganhasse uma milha aérea por cada minuto que passo zelando por seu sono, certamente poderia voar até Bangladesh. E você, cabeça de hot dog, claro que iria comigo! O que faríamos em Bangladesh? Ué, o mesmo de sempre: absorveríamos de mãos dadas e corações trançados – o que é bem mais interessante – as múltiplas experiências que um país novo pode oferecer a um casal que se dá bem em qualquer língua e até quando só pode se comunicar através de gestos. Não está bom? Para mim, está perfeito.

Ricardo Coiro

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